Um Teosofista Pioneiro Examina
Em 1918 o Tema do Amor à Pátria
 
 
Raymundo Pinto Seidl
 
 
 
Uma rua da Tijuca no Rio de Janeiro em 1918
 
 
 
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Nota Editorial de 2017:
 
O texto a seguir discute como o Brasil
deve encarar a celebração de um centenário
da sua independência, e é extremamente
atual na primeira metade do século 21.
 
Pioneiro da teosofia no Brasil, Seidl esclarece a
natureza do sentimento de amor à pátria dentro
do contexto teosófico. A fraternidade universal
se constrói em escala planetária através do respeito
às nações. A cooperação une os povos com base
na correta valorização de cada comunidade e de
todas as culturas. Nas obras de Helena Blavatsky e  
nas Cartas dos Mahatmas, fica claro que é natural e
saudável o profundo amor pelo país em que nascemos.
 
O texto foi publicado pela primeira vez com
o título de A Grande Data Nacional”, na edição
de setembro de 1918 de “O Theosophista”, Rio de
Janeiro, páginas 89 e 90. A ortografia foi atualizada.
 
(Carlos Cardoso Aveline)
 
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De hoje a quatro anos será comemorado o primeiro centenário da Proclamação da nossa Independência.
 
Já se discutem os modos de solenizar tão importante data nacional. Monumentos grandiosos, publicações comemorativas, festejos cívicos retumbantes, congressos científicos e literários têm sido lembrados para rememorar esse dia, em que o Brasil surgiu como nação.
 
Membros de uma associação cujo objetivo primordial é a constituição de um núcleo de fraternidade universal na Humanidade, sem distinção de espécie alguma, inclusive de nacionalidades, não devem esquecer, entretanto, os teósofos, de trabalhar em prol da pátria de seu nascimento e de estar prontos para defender a sua integridade, porque “se viver para a Humanidade trabalhando pelo progresso da pátria é a mais nobre das vidas – morrer pela Humanidade defendendo a integridade da pátria é a mais gloriosa e santa das mortes”.
 
O patriotismo do teósofo é inspirado no verdadeiro amor, pois não traz na sua contextura o menor laivo de ciúme ou de prevenção contra qualquer nação ou contra qualquer povo. Deve, por isso mesmo, ser mais veemente, mais entusiástico, mais vibrante.
 
O teósofo sabe que a Terra é uma escola e que os atuais cidadãos de uma determinada pátria, nas suas encarnações anteriores, em outras pátrias já nasceram e lutaram. O espírito é levado a encarnar-se na família, no povo, na pátria, no continente onde pode receber as lições mais convenientes ao seu progresso; e em relação ao continente, à pátria, ao povo e à família em que surge, tem o homem dívidas cármicas a pagar.
 
O conhecimento dessas verdades mostra ao teósofo que o amor da família e da pátria não é senão um caso mais restrito do amor à Humanidade e que as nações “verdadeiramente” civilizadas não devem buscar elevar-se sobre as outras nações, porém, aprestar-se para bem servir à Humanidade. Somente assim orientado, o patriotismo é uma virtude, porque visa o Bem e o Justo; de outra forma, não.
 
Sirva a exposição desses princípios comuns a todos os estudantes sinceros de Teosofia, para justificar o modo como julgamos que a nossa pátria querida deverá comemorar o Centenário da sua Independência.
 
Pensamos que não poderia o Brasil de melhor maneira comemorar a sua Independência do que provando que é realmente um país civilizado cristão. E de nenhuma outra forma tão eloquente poderia a pátria brasileira mostrar-se digna desse qualificativo, do que declarando-se liberta do analfabetismo, do alcoolismo, do jogo, do lenocínio, da desonestidade política e administrativa; demonstrando o seu sentimento de fraternidade universal pela devolução dos troféus e cancelamento da dívida de guerra dos nossos irmãos paraguaios [1]; fazendo cessar as questões de limites entre os Estados; estabelecendo leis “justas” reguladoras da exploração do trabalho do operário; assegurando aos trabalhadores a mesma assistência que o Estado outorga aos seus funcionários; reconhecendo às mulheres os mesmos direitos civis e políticos de que os homens gozam e muitas vezes abusam; impedindo que os argentários deem ao capital o emprego indigno e inumano que costumam [2] dar; encarando, em suma, os problemas nacionais, sempre e sempre, pelo prisma excelso da lei da fraternidade universal.
 
Para conseguirmos a realização desse programa cívico, precisamos trabalhar muito e muito. Numerosos serão os obstáculos que o egoísmo fará surgir. Nada, porém, de desânimos. Trabalhe cada um de nós dentro de sua esfera de atividade pelo pensamento, pela palavra e pela ação, e se não pudermos realizar esse programa na íntegra, ao menos alguns de seus pontos poderemos conseguir.
 
A vitória depende da energia, da vontade, da perseverança, e acima de tudo, do sentimento de fraternidade dos soldados dessa grande campanha em prol do progresso do Brasil.
 
R.S.
 
NOTAS:
 
[1] Alusão à Guerra do Paraguai, travada entre os anos de 1864 e 1870. Sobre este conflito militar, veja em nossos websites associados o livro “O Duque de Caxias”, de Raymundo Pinto Seidl. (CCA)
 
[2] “Costumam”: no original, “soem”. Sinônimo de “costumar”, o verbo “soer” é hoje pouco usado. (CCA)
 
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Veja em nossos websites associados o artigo “General Raymundo Pinto Seidl”, de Aleixo Alves de Souza.
 
Sobre a história do movimento teosófico no Brasil, veja os artigos “Breve Histórico da Teosofia no Brasil”, “Origem do Movimento Teosófico no Brasil”, “Bispo Católico Visita Plantações em Marte”, “A Teosofia no Brasil”, “Besant Anuncia Que é Mahatma” e “Leadbeater Diz Que Matou Brasileiros”.
 
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