Pomba Mundo
 
Autoestima Permite
Valorizar Melhor a Vida de Todos 
 
 
Carlos Cardoso Aveline
 
 
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A longa experiência acumulada pelo movimento esotérico demonstra para o observador atento que é inútil aderir a crenças coletivas automáticas, ou realizar rituais inspirados na religiosidade medieval.
 
É a Psicologia, definida como conhecimento da alma, que cumpre um papel decisivo no século 21.
 
Os pioneiros de uma civilização fraternal devem estudar e compreender a si próprios, em primeiro lugar. Cabe a eles transmutar em sabedoria a sua própria ignorância e compreender o mistério das relações humanas. É correto parafrasear Terêncio e dizer:
 
“Sou um ser humano, e tudo que é humano me diz respeito.”
 
O processo do discipulado é um aprendizado e não uma crença, e passa hoje longe do cerimonialismo. Ele implica o estudo da consciência humana, emocional, mental, e espiritual. No século 19, um Mestre de Sabedoria deixou claro que os testes do discipulado moderno ocorrem no terreno da psicologia da alma:
 
“O aspirante é agora atacado inteiramente no lado psicológico da sua natureza. O processo de testes – na Europa e na Índia – é o da Raja Ioga, e o seu resultado é, como tem sido explicado frequentemente, o desenvolvimento de todos os germes, bons e maus, que há nele e em seu temperamento. (…) Assim como a chuva não pode fazer frutificar a rocha, tampouco o ensinamento oculto surte efeito sobre a mente que não é receptiva; e assim como a água aumenta o calor da cal cáustica, também o ensinamento coloca em impetuosa ação todas as insuspeitadas potencialidades latentes no aspirante.”[1]
 
Desde o século 20, uma corrente de pensadores humanistas tem dado uma contribuição ao progresso humano, reduzindo até certo ponto as desgraças do materialismo.
 
A Análise Transacional trouxe bom senso ao enfoque psicológico das relações interpessoais. Best-sellers como “Eu Estou OK, Você Está OK”, de Thomas A. Harris, popularizaram um conhecimento correto sobre os diferentes níveis de consciência existentes na alma humana, e ensinaram maneiras práticas de encontrar equilíbrio e harmonia promovendo ao mesmo tempo a prática da sinceridade na vida diária. [2]
 
Erich Fromm, Viktor Frankl, Karen Horney, Rollo May e outros denunciaram e enfrentaram a materialização e a “mercantilização” da vida humana. A onda de consciência psicológica saudável vem popularizando mais recentemente o conceito de “bullying”, fenômeno definido como “o uso da força, de ameaças ou coerção para abusar, intimidar, ou dominar agressivamente outras pessoas”. Patricia Evans está entre os autores dos livros de maior sucesso sobre o tema do abuso verbal.[3]
 
A Sinceridade Gera Respeito
 
Há séculos o desrespeito não é difícil de observar nas relações humanas. Nossa civilização enfrenta processos crônicos de desprezo pela vida e pela ética. A hipocrisia de uns gera a descrença de outros. O ceticismo e a decepção acumulados provocam ondas de desrespeito.
 
Igrejas, rituais e cerimonialismo, ainda que “esotéricos”, não oferecem soluções. Ao contrário. Em geral, agravam o problema. As ilusões devocionais estão entre as formas mais desastrosas de abuso. A mentira piedosa obstaculiza a aprendizagem da alma. A credulidade acaba por provocar a descrença cega e a agressividade impensada.   
 
A falta de autoestima leva ao desrespeito pelos outros. Guerras, violência urbana e terrorismo são formas de desprezo pela vida própria e pela vida dos outros. Quando banqueiros e políticos enganam o povo, por exemplo, ou formam parcerias ocultas com traficantes de drogas e mercadores de armas, estão cometendo abuso contra as regras de convivência dos seres.   
 
No carma humano acumulado, o abuso verbal entre pessoas está ligado a formas mais amplas de injustiça que ocorrem em níveis econômicos e sociais. O desrespeito pessoal – falado ou pensado – interage invisivelmente com cada forma política, financeira e cultural de desprezo pela vida.
 
O esoterista pode secretamente invejar o seu colega de busca da verdade. O marido talvez abuse verbalmente da sua esposa, e vice-versa. Os pais podem abusar dos seus filhos, e uma criança com frequência desrespeita outras crianças. Todas estas formas de derrota são comuns em nossa civilização atual. Elas devem ser observadas e compreendidas com calma, e então transmutadas.
 
Alguns abusos são ostensivos, e outros, disfarçados. Em certas situações, surgem explosivamente. Em outras, ocorrem de modo sutil e implícito. Em muitos casos são até difíceis de perceber no plano consciente. Todas as formas de má vontade resultam da ignorância. Surgem sempre de um indivíduo internamente fraco e medroso, que ainda não aprendeu a lição da honestidade para consigo mesmo.
 
Expandindo Antahkarana, a Ponte
 
Da busca não-dogmática da verdade surge o respeito incondicional por todos os seres. O indivíduo que aprende a respeitar a si mesmo pode, sobre esta base, respeitar os outros. A força do respeito depende de capacidade de expandir antahkarana, a ligação de cada um com sua própria alma espiritual. O indivíduo deve libertar-se dos sistemas de crença automática.
 
Quem pensa por si mesmo valoriza melhor a vida. O dever do teosofista é lutar contra o círculo vicioso da ignorância, colocando em movimento o círculo virtuoso da sabedoria. Há um encadeamento de causas e efeitos que gera sinceridade mútua, justiça, paz e harmonia.
 
Cabe ao movimento esotérico perceber a identidade essencial que há entre a ética, a teosofia e a psicologia do autoconhecimento. O verdadeiro saber sobre si mesmo implica o conhecimento das leis éticas que governam a vida de dentro para fora.
 
As enormes limitações enfrentadas pelo movimento teosófico no século 21 transmitem lições de humildade e sinceridade, não só para os seus membros, mas para os seguidores de todas as associações esotéricas.
 
Ninguém está livre de erros, e todos podem aprender. A prática mostra que só a mente altruísta deixa de distorcer a verdade e, por isso mesmo, pode olhar os fatos de frente. O movimento esotérico já começa a libertar-se da politicagem “espiritual” e do exercício das artes manipulatórias em relações humanas.
 
É sua potencialidade sagrada transformar-se em uma federação livre de pesquisadores que, armados de boa vontade, destroem em si próprios e ao seu redor os mecanismos de falsidade consciente ou semiconsciente.
 
O pioneiro da fraternidade planetária não presta demasiada atenção à aparência. Ele procura pela verdade essencial, sempre situada além da mera superfície das coisas. Ele deseja o bem de todos os seres, sabendo que todos são espelhos apresentando reflexos e variações de si próprio.
 
NOTAS:
 
[1] “Cartas dos Mahatmas”, Ed. Teosófica, Brasília, volume II, Carta 136, p. 316.
 
[2] Veja em nossos websites associados o artigo “A Teosofia do Namastê”, de Carlos Cardoso Aveline. O seu subtítulo é “Okeidade Mútua: a Análise Transacional e a Construção de uma Psicologia da Fraternidade”.
 
[3] Um dos livros bem conhecidos de Patricia Evans é “Como Enfrentar a Violência Verbal”, Ed. Sextante, 2015, 256 pp.
 
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Uma versão inicial do artigo “O Respeito Derrota Agressões” foi publicada sem indicação do nome do autor na edição de maio de 2015 de “O Teosofista” (pp. 2-4).
 
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Para conhecer um diálogo documentado com a sabedoria de grandes pensadores dos últimos 2500 anos, leia o livro “Conversas na Biblioteca”, de Carlos Cardoso Aveline.
 
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Com 28 capítulos e 170 páginas, a obra foi publicada em 2007 pela editora da Universidade de Blumenau, Edifurb.  
 
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