A Cada Renascimento da Ética, Os
Novos Tempos Exigem Mais Franqueza  
 
 
Carlos Cardoso Aveline
 
 
 
 
 
O modo como falamos expressa as estruturas do carma humano. O grau de sinceridade é um elemento decisivo.
 
A atitude respeitosa é indispensável, e é preciso reconhecer ao mesmo tempo que só a franqueza de ideias permite um real diálogo. As palavras revelam o pensamento, quando são ditas com honestidade, mas o escondem, quando usadas pelos falsários do mundo mental.
 
Se a linguagem dos “líderes” sociais está voltada para os jogos de aparência, a mentira domina a cena coletiva até que alguém desmascare o falso consenso. Este princípio se aplica à família, às associações teosóficas e “esotéricas”, às igrejas, às empresas, à mídia e ao mundo político.
 
Palavras amáveis colocadas a serviço de uma meta egoísta produzem mau carma, impedem as pessoas de verem os fatos e envenenam a atmosfera cultural – até o dia em que a falsidade cai sob o seu próprio peso. Grandes instituições e estruturas ideológicas do mundo de hoje começam a ruir porque está vencido o prazo de validade das suas ilusões.
 
Todos percebem que a fala macia nem sempre expressa boa vontade. Um jeito duro de falar pode ser inofensivo em seu conteúdo, enquanto que palavras cuidadosas e diplomáticas frequentemente escondem sentimentos negativos. Por outro lado, os ataques no plano pessoal servem para esconder a falta de argumentos e a ausência de raciocínio.
 
Ser sincero é mais importante que ser diplomático, especialmente para quem busca a verdade. Não é necessário dar demonstrações externas de boa vontade a cada passo. Quando a boa vontade é profunda, ela transcende as aparências e autoriza a questionar os erros para que todos possam aprender e melhorar. A linguagem direta permite uma comunicação real: os eufemismos mascaram a realidade.
 
Observando o Modo de Conversar
 
Para enxergar a verdade além da encenação, observe como as pessoas usam as palavras cada vez que há um debate intenso. Em qualquer país do mundo, veja quem atribui sentimentos negativos a quem, de uma maneira talvez intensa, mas sem prova ou evidências.
 
Em toda guerra de palavras, a primeira vítima é a verdade. Cabe ao teosofista observar com serenidade aqueles que usam a falsidade como arma, e perceber quem fala de modo honesto.
 
Verifique os fatos. Identifique aqueles que falam com moderação enquanto a discussão prossegue, e evitam ataques pessoais. Examine os graus variados de consideração pelos outros e pela verdade. Olhe além das máscaras. Só quem respeita a si mesmo é capaz de ter consideração pela realidade tal como ela é, ou respeitar os oponentes como seres humanos. O autoconhecimento faz com que surja o autocontrole.
 
Há épocas na vida dos povos em que grandes doses de hipocrisia parecem ser politicamente elegantes e até inevitáveis. As palavras sinceras são então denunciadas como “coisa absurda”. Afirma-se que a franqueza é uma atitude arrogante, agressiva e antissocial. Considera-se uma grave ofensa se alguém não aceita as regras da falsidade socialmente aprovada.
 
No campo religioso, o ritualismo e a fé cega compensam a hipocrisia produzindo ódio, terror, guerra e violência. Ao mesmo tempo operações de propaganda em grande escala visam bloquear e inibir o pensamento independente de cada cidadão.
 
Mas a vida é simétrica e há também momentos históricos em que caem as máscaras dos sepulcros caiados.
 
Então surgem os indivíduos que trabalham com graus elevados de sinceridade, e eles trazem consigo uma completa mudança de situação. As marés de sinceridade estabelecem novas regras de convivência, segundo as quais ser honesto de fato é bom e eficiente, mas mentir e falsificar é desagradável e leva à completa derrota dos pinóquios, estejam eles disfarçados de líderes políticos, de comunicadores sociais, de religiosos ou espiritualistas.
 
A teosofia clássica ensina a independência em relação à chamada “opinião pública” e à religiosidade sectária.
 
Ela convida o ser humano a ser autorresponsável. Para a filosofia esotérica, ser bem-sucedido em qualquer área de atividade significa pensar por si mesmo, agir com criatividade e tornar-se um pioneiro em formas superiores de inteligência cooperativa.
 
Não se trata de dizer tudo o que se pensa indiscriminadamente e a todo momento.  Cabe abrir espaço para níveis crescentes de sinceridade. A ideia de mudanças demasiado súbitas é uma armadilha.
 
Sendo um processo orgânico, a honestidade precisa crescer aos poucos a partir da situação exata do momento presente, passo a passo, com realismo, com moderação e perseverança.
 
Os Políticos do Movimento Esotérico
 
A teosofia autêntica aconselha o peregrino a não esquecer que o caminho para a verdade é íngreme, estreito, cheio de espinhos e avança morro acima.
 
O ser humano sincero está  rodeado de aparências enganadoras. O discernimento é com frequência raro no estágio atual da evolução humana. Devemos aprender a desenvolver uma visão clara. A crença cega é um cavalo de Troia. Parece tornar as coisas mais simples, enquanto ataca desde o interior a nossa capacidade de defender-nos contra a ignorância.
 
A busca de conforto é parte da armadilha. E nem todos estão dispostos a trilhar um caminho incômodo.
 
Embora os teosofistas e esoteristas estejam acostumados a falar diariamente sobre “Maya”, ou Ilusão, é praticamente impossível encontrar um líder de alguma das grandes corporações do movimento teosófico ou esotérico que seja capaz de examinar em público a triste coleção de erros acumulados desde a última década do século 19.
 
Os dirigentes políticos do movimento parecem querer transmitir a todos a impressão de que não há nada a aprender do passado, e nenhum erro foi cometido. Isso equivale a uma fraude.
 
Qualquer epistemologia ou pedagogia que negue a necessidade de aprender com os erros é falsa. Uma tal “fraude mística” pode pertencer a igrejas autoritárias, mas não a um movimento cuja meta é a humilde busca da verdade.
 
Os movimentos esotéricos têm o dever cármico e também o poder iniciático de antecipar a civilização ética do futuro, construindo em pequena escala e num plano um pouco mais sutil a essência do que florescerá em seu devido tempo. Esta, naturalmente, é uma tarefa para pioneiros, para gente que sabe o que quer e evita perder tempo com ilusões.
 
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Uma versão inicial do texto acima foi publicada sem indicação do nome de autor na edição de março de 2016 de “O Teosofista”, pp. 5 a 7.
 
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Em 14 de setembro de 2016, depois de uma análise da situação do movimento esotérico internacional, um grupo de estudantes decidiu criar a Loja Independente de Teosofistas. Duas das prioridades da LIT são tirar lições práticas do passado e construir um futuro saudável.
 
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