Pomba Mundo
 
O Poeta Mineiro Que Investiga o Universo
 
 
Carlos Cardoso Aveline
 
 
Augusto de Lima com  mold
 
Augusto de Lima nasceu em 5 de abril de 1859
 
 
 
Além de defensor intransigente das florestas, pai do Código Florestal brasileiro, deputado federal e governador de Minas, Augusto de Lima (1859-1934) é um dos poetas brasileiros cuja obra tem a maior quantidade de poemas com profundo valor filosófico e esotérico.
 
Ao lado de Múcio Teixeira e outros, Augusto de Lima ergueu-se acima do estreito imediatismo das preocupações pessoais, para examinar com um olhar solidário aquilo que é eterno.
 
É verdade que, num país marcado pelo catolicismo romano, o pensamento ético e panteísta deste poeta-cidadão contrariou de frente os dogmas da religiosidade tradicional. Os interesses dominantes, ameaçados, podem ter provocado um cômodo esquecimento da sua obra. É um fato que seus livros são, hoje, raras preciosidades bibliográficas. Mas a qualquer momento pode renascer um amplo interesse em torno deles. A obra de Lima está voltada para o futuro e se identifica com o universo. Seus melhores poemas são imperecíveis e têm inúmeros pontos em comum com a teosofia ou sabedoria divina ensinada por Helena Blavatsky. Um exemplo disso, entre muitos, é a abordagem austera da luta que se trava na alma humana.
 
O estudante de teosofia começa sua caminhada por reconhecer um contraste em seu próprio mundo interno. De um lado ele tem sua alma mortal, o eu inferior, com seus interesses pessoais de curto prazo. De outro lado, está a alma imortal, o eu superior, com uma visão muito maior e mais ampla da vida e do universo. Augusto de Lima examina esta incômoda dualidade básica no poema “O Paradoxo”, e ele não usa meias palavras. Cito aqui o poema como se fosse um texto em prosa:
 
“Quem pôde jamais dizer-me com certeza de onde vim, se sou simplesmente um verme, ou se Deus está em mim? Mistério! A vida eu a sinto como um fluido incandescente nas veias; porém não minto dizendo que a acho excelente…  Mata-me o tédio do mundo e nisto encontro prazer. Como Hamlet meditabundo, agito o ‘ser e não ser’. Sou uma antítese viva, talvez um sonho do caos, extrato que Javé ou Shiva fez dos gênios bons e maus. (…) É que ardem, no paraíso, infernos; engana o amor; o lábio mente, e o sorriso é uma paródia da dor.” [1]
 
A solução do paradoxo está em voltar o olhar para o alto e transferir o foco da consciência desde a periferia da vida para a sua essência. O primeiro passo, no entanto, será perceber de fato o caráter passageiro da vida superficial e renunciar a ela. Esta lição é aprendida examinando o  mistério da passagem do tempo e  descobrindo que – na verdade – o tempo é eterno, e os seres mortais é que passam por ele, conforme Augusto explica:
 
“…. Nós é que passamos mais uma etapa no Tempo. Este é imutável: nunca foi novo e nunca será velho. (…) Sim, transitórios somos nós, astros, rocha, flora, fauna, espécie humana. Tudo passa, menos o Tempo e o Espaço, cujas balizas se perdem no Incognoscível.” [2]
 
Esta humildade realista permite erguer o olhar para o que é permanente, e assim compreender algo da Lei eterna. Sob a luz da consciência universal, o filósofo percebe a base da sabedoria divina (theo-sophia) que inspira as diferentes religiões. Ele sabe colocar em poucas palavras o conhecimento direto da unidade de todos os seres: 
 
“Há uma só lei na existência
sob a esfera luminosa:
partilham da mesma essência
homem, ave, estrela e rosa.” [3]
 
Este é um dos principais axiomas da filosofia esotérica.
 
NOTAS:
 
[1] Do volume “Poesias”, Augusto de Lima, Editora H. Garnier, Rio de Janeiro / Paris, 1909, 300 pp., ver pp. 64-65.
 
[2] Do livro de crônicas “Noites de Sabbado”, Augusto de Lima, Alvaro Pinto Editor, Rio de Janeiro, 414 pp., 1923, ver pp. 216-217.
 
[3] “Augusto de Lima, Seu Tempo, Seus Ideais”, José Augusto de Lima, Ministério da Educação e Cultura, 1959, 322 pp., ver p. 226.
 
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Sobre o mistério do despertar individual para a sabedoria do universo, leia a edição luso-brasileira de “Luz no Caminho”, de M. C.
 
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Com tradução, prólogo e notas de Carlos Cardoso Aveline, a obra tem sete capítulos, 85 páginas, e foi publicada em 2014 por “The Aquarian Theosophist”.
 
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